
Se alguma vez eu tive acesso a um sentimento de companheirismo autêntico, foi quando liguei meu aspirador-robô.
Às vezes a preguiça toma o controle e me deixo emergir no caos de uma casa desarrumada. Mas a subserviência do aspirador-robô, sempre pronto a ajudar, ativa em mim toda uma reserva de energia para arrumação.
Para otimizar o trabalho dele, preciso recolher as coisas do chão. Mas pô-las nas mesas? Não, isso só aumentaria a bagunça. Pô-las, portanto, no lugar que deveriam ser guardadas.
Quando ele passar próximo às mesas, preciso aproveitar para passar um pano e escorrer toda a sujeira para baixo delas. Quando ele for para um cômodo, preciso ir junto a vigiá-lo.
A este ponto já fui tomado pela minha persona limpadora, um ser agitado, inquieto, a todo instante criador de novas formas de manter a casa mais aprumada.
De repente já estou sem camisa, vibrante, sentindo cada trecho daquela da Cássia, “mudo uma planta de lugar, dirijo meu carro. Tomo o meu pileque. E ainda tenho tempo pra cantar.”
A Alexa brilhando com o Novidades da Semana é capaz de dar uma sobrevida que acabo lavando o banheiro também. Ou limpando um fogão. Ou dobrando a roupa que estava estendida no varal há 15 dias.
Não que a relação com o robô não tenha seus percalços. Ele não consegue trabalhar sozinho, senão trava ou fica preso em algum pano de chão. É uma criança desatenta, que cai sempre nas mesmas armadilhas. Exige, demanda companhia, atenção. Uma aula de trabalho cooperativo.
Ao fim de mais uma jornada, retiro o filtro do robô-aspirador e sinto que se passasse duas semanas sem limpar a casa, ela seria imersa em um urso gigante e intransponível de poeira.
Diante disso, agradeço novamente ao meu amigo robô.
Coloco-o na tomada e, com um pano úmido, acaricio sua cabeça. Afinal, quem aspira a poeira do aspirador-robô?
Só um verdadeiro companheiro.